Thaís Hellen Silva conta com orgulho que participava dos movimentos indígenas em Pacatuba, cidade próximo de Fortaleza (CE), ainda na barriga da mãe. Cresceu fazendo parte de vários grupos indígenas e prefere ser identificada por seu nome indígena – Aimara Pitaguary. Aos 15 anos, ela observa que adquiriu a compreensão de seus direitos em sua formação diária, mas já sabe que nem sempre o acesso à informação e o direito à participação são garantidos a cada menina e cada menino.
“Daí, a importância do Nuca”, diz Aimara, enfaticamente. Ela faz referência ao Núcleo de Cidadania de Adolescentes (Nuca), um mecanismo proposto pelo UNICEF aos municípios do Selo UNICEF como forma de facilitar a garantia do direito à participação de meninas e meninos nas decisões que impactam sua vida nas comunidades, atendendo ao Estatuto da Criança e do Adolescente. Em sua experiência, Aimara acredita que esses espaços são fundamentais para atrair adolescentes que ainda não são engajados em outros grupos e não têm acesso a informações sobre seus direitos, garantindo o respeito e a voz de cada um, em especial aqueles de comunidades tradicionais.
“Tem adolescente que vem fazer parte sem entender muito o que é, mas, quando descobre as mil possibilidades, se encanta. A gente reúne pessoas diferentes e discute muitos temas, entramos em contato com a gestão do município, é muito importante”, afirma. Como o UNICEF estimula a diversidade na composição dos núcleos, entre gêneros, raças, etnias, pessoas com deficiências e outras diferenças, Aimara destaca o benefício para o enfrentamento da discriminação e para as populações tradicionais; e não tradicionais também. “Quem não tem a oportunidade de interagir em outros grupos consegue fazer isso no Nuca. Além disso, é uma oportunidade para adolescentes não indígenas ampliarem suas visões”, reforça.
No Nuca de Pacatuba já foram discutidas questões como desmatamento e garimpo em terras indígenas, além de abusos sofridos por adolescentes. “Mesmo que a gente não consiga uma solução imediata, chamar a atenção de outras pessoas já é importante. Se só uma pessoa cantar, o toré não acontece. Precisa do coletivo”, diz, lembrando ainda de outros temas abordados pelo Nuca, como mudanças climáticas, racismo e gravidez na adolescência. Aimara também destaca o diferencial da comunicação e mobilização entre pares. “Adolescente falando com adolescente é diferente. A gente fica mais à vontade”. Por sua participação ativa no Nuca e no município, a adolescente foi convidada para participar também do Conselho Jovem do UNICEF, criado para promover o diálogo direto com adolescentes, com reconhecimento da importância de sua voz e seus conhecimentos, além de mais um fomento à participação cidadã.
Um lugar para se encontrar e reconhecer
A mãe de Aimara, Ana Clécia Silva, é uma liderança indígena que acompanha a gestão no muncípio e celebra, desde o início dos anos 2000, a existência de escolas indígenas, que recebem alunos indígenas e não indígenas. Mas lembra da discriminação vivida por muitas crianças em escolas tradicionais. “As crianças eram impedidas de entrar por conta das pinturas e as pinturas levam até 15 dias para sair. Na aldeia não tinha escola e na escola tradicional elas não se encontravam...”.
Aimara conta que ainda hoje sente-se discriminada. “Falam que sou indígena fake porque tenho celular, porque estamos evoluindo. Mas é um trabalho nosso, temos esse direito”, reforça. Ela se diz esparançosa pela maior presença e participação em grupos e convida outros adolescentes a buscar os Nucas de seus municípios. “É uma excelente forma de união e de ganhar forças, vir atrás de seus direitos e melhorar seu município”, afirma.
NUCAs – O direito de meninos e meninas de participar nas decisões de sua comunidade que impactam em suas vidas é assegurado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. Como forma de facilitar a implantação de mecanismos que garantam essa participação, o UNICEF propõe a criação de núcleos de cidadania de adolescentes (Nucas). Sua proposta é articular adolescentes em rede para discutir questões importantes para seu desenvolvimento, implementar ações e levar suas reivindicações à gestão pública municipal. Os municípios que participam do Selo UNICEF, como é o caso de Pacatuba, são convidados a implementar Nucas.
Selo UNICEF – O Selo UNICEF é a principal iniciativa do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) no Brasil que atua a partir do estímulo e reconhecimento de avanços reais e positivos na promoção, realização e garantia dos direitos de crianças e adolescentes em municípios do Semiárido e da Amazônia Legal brasileira. A Edição 2017-2020 conta com a participação de 2.023 municípios de 18 Estados brasileiros, sendo 676 na Amazônia e 1.347 no Semiárido. Seu sucesso é resultado da parceria entre o UNICEF e muitos parceiros, a exemplo de governos estaduais e municipais por meio da atuação integrada entre diferentes níveis de governo voltados para crianças e adolescentes.