Secretária de Proteção Social do Ceará aponta estratégias para elaboração e monitoramento dos planos da primeira infância

Onélia Santana é secretária de Proteção Social, Justiça, Cidadania, Mulheres e Direitos Humanos do Ceará (SPS), ex-primeira-dama do estado e idealizadora do programa Mais Infância Ceará
Onélia Santana é secretária de Proteção Social, Justiça, Cidadania, Mulheres e Direitos Humanos do Ceará (SPS), ex-primeira-dama do estado e idealizadora do programa Mais Infância Ceará

 

O 5º Encontro Estadual do Comitê Consultivo Intersetorial das Políticas de Desenvolvimento Infantil no Ceará certificou, no dia 28 de março deste ano, 175 municípios cearense com diplomas ouro, prata e bronze por terem concluído, aprovado e instituído planos municipais para a primeira infância. O reconhecimento partiu da Secretaria da Proteção Social, Justiça, Cidadania, Mulheres e Direitos Humanos (SPS). A atual titular da pasta e ex-primeira-dama no Ceará, Onélia Santana, detalhou ao Selo UNICEF avanços e desafios da primeira infância no estado e as estratégias para a elaboração e o acompanhamento dos PMPI. Ela também aponta as dificuldades enfrentadas por crianças e suas famílias durante a pandemia.

Leia a entrevista completa:

Quais são as principais dificuldades vivenciadas, hoje, pela população de primeira infância no estado do Ceará? E que avanços ocorreram na última década?

Cuidar da criança é também cuidar da família, e trabalhar com a primeira infância é construir, a médio e longo prazos, uma sociedade mais justa. Para isso, precisamos lidar com dois grandes desafios, quebrar os ciclos da violência e da desigualdade social, da pobreza. Importante também destacar que precisamos contemplar diferenças infâncias, a urbana, a rural, a de comunidades tradicionais, indígenas, quilombolas. Cada uma delas precisa de atenções e cuidados diferenciados. Muito já foi feito no Ceará, como a redução da desnutrição e da mortalidade infantil. Quando falamos em mortalidade infantil, tínhamos um dado que era a morte de 100 crianças a cada mil. Alcançamos os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, com a drástica redução para 12 crianças a cada mil nascimentos. Outra atenção para a qual estamos voltadas é a da mortalidade neonatal, em que também registramos avanços. Estamos trabalhando muito para fortalecer a parentalidade nas famílias, ou seja, o papel responsável do pai, da mãe e dos demais cuidadores no crescimento das crianças; os problemas com gravidez na adolescência, com muitas mães solos (solteiras) e que necessitam de apoio integral. Para promovermos o desenvolvimento socioinfantil, estamos trabalhando fortemente a visitação familiar, e o apoio e acompanhamento das famílias beneficiadas pelo Cartão Mais Infância, ação estadual de transferência de renda que integra o programa Mais Infância Ceará. Também ampliamos a formação técnica das portas de entrada dos serviços, nas áreas da saúde, educação e da assistência social, para que as famílias se sintam acolhidas e sejam cuidadas dignamente.

Quais os maiores impactos trazidos pela Covid-19 para esse público?

A Covid foi uma crise sanitária, econômica e social muito grave e inesperada, que alterou muito os indicadores do Estado e do País. Crianças e gestantes encontraram dificuldades de acesso aos serviços das unidades básicas, seja pelo medo de contágio, seja pela orientação pública para que evitassem de ir às unidades de saúde. Isso resultou na redução de consultas de pré-natal e na dificuldade de detecção precoce de gestação, enquanto crianças enfrentaram dificuldades para fazer a puericultura. Foram inúmeras as dificuldades de acesso das mães às redes de apoio, inclusive na gestação e no parto. Assim como o medo da morte também impactou na saúde mental das pessoas. Outro impacto foi no acesso à Educação. Passamos muito tempo com as crianças em isolamento social, sem aulas presenciais, distantes desse ambiente protetivo que é a escola. A crise econômica é outro desafio. Adotamos medidas para apoiar as famílias e minimizar os efeitos da pandemia na vida dos cearenses, como os programas do Vale Gás Social, doação de cestas básicas, de kits de higiene e de máscaras de proteção, ampliação do número de famílias no Cartão Mais Infância e instituição do programa de redução das tarifas de água e luz às famílias em situação de vulnerabilidade social. O número de famílias atendidas com Cartão Mais Infância foi ampliado de 48 mil para 150 mil famílias. Outra medida foi a criação dos Agentes Sociais Mais Infância, para fortalecermos, acompanharmos e monitorarmos, com dados reais e localizados, as ações do Programa. Foram doadas cerca de 2,2 mil toneladas de alimentos e 68.070 cestas básicas através do Programa Mais Nutrição. Em 2020, foi criado o Vale Gás Social, que tornou-se política pública permanente em 2021, determinando a distribuição dos tíquetes três vezes ao ano. Em 2020, foram distribuídos 245.966 tíquetes e, em 2021, foram 255.577. O investimento nos dois anos foi de R$ 29.933.113. Nosso grande objetivo, mais do que nunca, foi priorizar as famílias em situação de vulnerabilidade social. Não podemos ter famílias invisíveis aos olhos do Estado e da sociedade.

Como o Estado pretende apoiar/ acompanhar a execução dos planos municipais para a primeira infância?

O trabalho de construção de políticas públicas só dá certo quando todos se dão as mãos, é uma parceria entre Estado e municípios. Apoiar os municípios na construção dos planos é fortalecer um vínculo de cooperação. Também acreditamos muito no planejamento, pois ele nos permite identificar vários cenários, perspectivas de crescimento, inovação, e nos auxilia na construção de políticas públicas com melhores resultados. Um dos nossos pilares de ação é trabalhar as políticas públicas baseadas em evidências. Outro aspecto importante do planejamento é identificar a destinação adequada do orçamento para darmos continuidade e sustentabilidade às ações. Quando inicia- mos a mobilização para construção dos planos municipais, alguns municípios já tinham seus planos elaborados, mas os convidamos a revisitá-los e atualizá-los com a perspectiva do novo cenário e dos desafios impostos pela pandemia. Precisamos avançar. A crise requereu maior agilidade na construção dos planos municipais. Para cada plano, analisamos o cenário e traçamos um caminho, definindo onde estamos e onde queremos chegar. O primeiro passo para realizar os planos municipais foi o diagnóstico das diferentes infâncias frente aos diferentes cenários e contou com as bases de dados federais, estaduais, mas, principalmente, municipais. A premiação foi uma forma de estimularmos e reconhecer- mos os municípios pela evolução na construção dos planos à primeira infância. Fica- mos muito felizes com o resultado. Dos 184 municípios cearenses, 175 tiveram seus planos aprovados e, destes, 145 obtiveram padrão ouro. Ou seja, foram aprovados pelo Conselho Municipal da Criança e do Adolescente e pelas câmaras legislativas. O Estado pretende acompanhar sistematicamente os planos. Estamos formalizando parcerias com o Instituto da Infância (Ifan) e o UNICEF para monitorá-los nas grandes áreas, de forma abrangente. Queremos trabalhar com os comitês municipais à primeira infância, por serem intersetoriais, a partir de ferramentas de acompanhamento para estarmos focados na realidade das ações. O objetivo é torná-las factíveis, com resultados reais. Não podemos fazer planos de gaveta. Planos precisam ser reais, sempre.

Quais atores devem estar envolvidos na elaboração do PMPI? Como potencializar a participação de crianças e suas famílias?

Planos à primeira infância devem ser construídos, em conjunto, por profissionais da gestão e por agentes que operam na ponta, que executam a política da infância. Trabalhamos muito com os comitês municipais, porque eles unem diversos atores e áreas. Participaram, principalmente, profissionais da saúde, educação, assistência social e meio ambiente, mas várias cidades incluíram ações de infraestrutura, de esporte e cultura, desenvolvimento agrário e de demais secreta- rias. A construção dos planos mexeu muito com os municípios, envolveu agentes da base, envolveu os que fazem a gestão e os que executam as políticas públicas. Ouvir as crianças é fundamental para que saibamos o que esperam dos seus gestores, da sua cidade, o que elas avaliam que precisa ser melhorado em suas vidas. Isso nos ilumina os caminhos a perseguir. Estimulamos as conversas com as crianças e obtivemos depoimentos que nos permitiram enxergar a cidade e as políticas públicas pela ótica da criança. Quanto mais atores participam desse processo, maior a responsabilidade de todos, pois nos apropriamos da realidade e nos envolvemos do planejamento à execução do plano.